O abade Johann von Heydenberg aus
Trittenheim/Mosel, mais conhecido como Johannes Trithemius (ou Ioannis
Trithemius), foi um prodígio no mundo monástico. De origem humilde, desenvolveu
o gosto pelas letras desde a tenra idade. Aos 15 anos fugiu de casa para
estudar em Trier e, posteriormente, em Heidelberg. Em 1482, aos 20 anos de
idade, ele passou uma noite no mosteiro beneditino de Sponheim. No manhã
seguinte, ao continuar a viagem, foi surpreendido por uma nevasca que o forçou
a retornar ao mosteiro. Considerou o fato como um sinal de que deveria se
tornar monge. Seus novos irmãos devem ter tido a mesma impressão pois, um ano
mais tarde, mal terminando seu noviciado, elegeram-no abade. Trithemius foi um reformador,
ávido por recuperar a glória perdida dos "séculos de ouro" da vida
beneditina medieval. Seu monastério pertencia à nova Congregação de Bursfeld,
um movimento de reforma monástica, da qual Trithemius se tornou o líder
teológico.
Bad Kreuznach na atualidade,
local onde ficava o Mosteiro de Sponheim.
Chocado com o fato de que os monges de Sponheim
vendiam gradualmente os livros para garantir um estilo de vida confortável (e
pouco literário), o novo abade iniciou imediatamente a recuperação da
biblioteca a qual, em apenas vinte anos, viria a se tornar uma das melhores da
Europa. Em 1505 ele havia aumentado a coleção de 40 livros para mais de 2000.
Além dos trabalhos tradicionais em Latim, Trithemius colecionou textos em
Grego, Hebraico, Siríaco, Árabe e várias línguas européias. Para alguém famoso
e conhecido como o autor de um tratado intitulado Exaltação aos Escribas,
Trithemius não se esquivou da nova tecnologia da impressão, tanto que sua
biblioteca incluía tanto obras manuscritas quanto impressas.
Em 1505, Trithemius deixou Sponheim. Havia levado
seus monges à exaustão com suas ordens para que estudassem e desempenhassem
melhor suas obrigações monastéricas e sobrecarregou suas finanças para ampliar
a biblioteca. Insatisfeitos, os monges exigiram a sua saída. Não foi uma
despedida alegre. Trithemius partiu cheio de amargura em relação a muitos dos
seus confrades e, o que foi pior, sem os seus livros. No ano seguinte tornou-se
abade do mosteiro de St. Jakob, em Würzburg, onde deu continuidade aos seus
projetos literários até a sua morte em 1516.
STEGANOGRAPHIA
Fig.1 -
Steganographia de Johannes Trithemius.
Mainz:
Christophorus Küchlerus, 1676.
A obra mais controvertida de Trithemius é seu
tratado inacabado sobre esteganografia, escrito ao redor de 1500 e impresso
somente em 1606. Durante mais de cem anos, o texto circulou sob a forma de
manuscrito. Trithemius não foi o primeiro monge intrigado com códigos - existem
algumas cartas de Pachomius, líder egípcio no século IV do movimento monástico
cenobítico (comunal), escritas em um código que até hoje não foi quebrado.
Não foi tanto o interesse pelos códigos que
trouxeram problemas para Trithemius, mas sim, seus ensinamentos em conjurar os
espíritos angelicais como intermediários entre remetente e destinatário. Ele
dissimulou seus ensinamentos com todos os enfeites de um culto esotérico,
inclusive com juramentos secretos e discussões deliberadamente obscuras da
técnica utilizada.
OBSERVEM SÓ OS COMENTÁRIOS QUE ACHEI NA INTERNET:
“Como muitos outros do seu tempo, Trithemius tinha uma forte crença em anjos,
demônios e outros espíritos, e ansiava usar suas energias na evolução da
teologia cristã. Este objetivo era semelhante à sua insistência de que o ensino
clássico e objetos seculares eram complementos úteis, quase que indispensáveis,
para a pesquisa teológica." (
Hill Monastic Manuscript Library)
Na verdade, Trithemius foi um nerd na época de
1500, dotado de muita astúcia e espírito brincalhão. Somente há alguns anos os
"grandes segredos esotéricos" do "mago" Trithemius foram
revelados: não se trata de telepatia ou conjuração de inteligências
planetárias. Na verdade, trata-se de um sistema de cifras muito bem elaborado!
(mais sobre o assunto no texto "O segredo do terceiro livro" em
Criptografia NumaBoa/História)
Steganographia contém exemplos de cifragem
nos quais uma mensagem secreta é escondida numa "mensagem clara" que
faça sentido. Mais problemática é a adição de um sinal secreto que indica qual
dos espíritos angelicais deve ser invocado para ajudar na transcrição e, ainda
mais problemática, é a afirmação no Livro Três de que mensagens podem ser enviadas
através destes intermediários sem qualquer tipo de texto escrito. A página
mostrada na figura 1 ilustra a mensagem clara (uma carta de recomendação),
depois o feitiço que vai alertar o destinatário para o código usado (o feitiço
era indicado por um símbolo encriptado) e, finalmente, no final da página, a
mensagem secreta pretendida: "Proteja-se desta pessoa porque é um homem
perverso e não tem nada de bom a dizer."
POLYGRAPHIAE LIBRI SEX
Poligraphiae - livro seis
A Polygraphia de Trithemius é uma
exposição muito mais direta da criptografia, não contendo as enfeites mágicos
encontrados na Steganographia. A obra, terminada em 1508, foi impressa
logo após a morte de Trithemius, cerca de um século antes da Steganographia.
No prefácio Trithemius delineia a história da poligrafia desde a sua origem no
Egito antigo, através do tempo dos gregos e romanos, até a era cristã. Assinala
a notável habilidade mostrada pelos franceses, em particular a de Charlemagne.
Recomenda ao Imperador Maximiliano, ao qual o trabalho é dedicado, para seguir
o exemplo de Charlemagne. Reconhecendo que o imperador tem outros deveres,
Trithemius conclui informando que adicionou uma chave poligráfica para fazer
com que a técnica fosse mais facilmente aplicada. Esta técnica está descrita no
texto "A Tabula Recta de Trithemius" em Criptografia
Numaboa/Substituição/Polialfabética.
A maior parte do livro contém listas de letras
código e seus equivalentes. Mas não é só isto. A página mostrada na figura 2,
por exemplo, detalha o "código" (mais propriamente, uma forma de
abreviação) que Trithemius atribuiu a Cícero.
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