Ralph M. Lewis, FRC
LIÇÃO 1*
Teria o ocultismo um real valor nestes dias e nesta era? O ocultismo tem tido uma reputação má, em muitos círculos públicos. Consequentemente, o ocultismo consiste de crenças e práticas supersticiosas, que têm que ser abandonadas nos tempos modernos, na condição de coisas sem nenhum valor, ou então consiste de uma nobre busca da verdade, uma busca da qual abusaram os charlatães, mal representados, e de onde as fraudes foram usadas para se tirarem vantagens.
No sentido popular, o termo ‘ocultismo’ se aplica a coisas que estão escondidas ou encobertas. Ele sugere, à mente, aquilo que diz respeito à magia e ao misterioso. Na realidade, o verdadeiro ocultista não é um diletante no sobrenatural; para ele, nada existe, que seja ”sobrenatural”. Todos os fenômenos estão dentro da categoria da lei natural. Ele não ama aquilo que é fantástico, aquilo que amedronta, aquilo que é estranho, e ele não é um buscador do sensacional. O ocultista é alguém que tem uma convicção íntima que existem princípios construtivos no universo, que são as causas de muitos das assim-chamadas coisas misteriosas, que existem além do raio de ação de nossos sentidos normais. Ele crê que nós não possamos esperar de os discernir de maneira objetiva, e que eles devem ser buscados em outros reinos da experiência humana.
Através dos séculos, o ocultismo desenvolveu suas próprias ciências. É – digamos – obrigatório que o ocultismo assim o faça, pois ele estava procurando algo, com o que a ciência física não poderia ajudar a esclarecer, ou realizar. As ciências ocultas, portanto, foram, a princípio, ridicularizadas pelos cientistas físicos. Elas foram consideradas fantásticas, absurdas; seus resultados, como estando fora dos limites da razão; e elas, que não deveriam ser levadas em conta. Acontece, entretanto, que as próprias ciências ocultas, com o tempo, chegaram a se tornar os pais de muitas da ciências físicas reputadas de hoje. Em verdade, da ciência oculta da astrologia, vieram os rudimentos da astronomia. Da alquimia, com a sua experimentação com ervas, de sua busca da quinta-essência e de elixires, vieram aqueles fundamentos, aqueles elementos e propriedades físicas, que se desenvolveram, chegando à ciência da química. Por outro lado, foi o ocultismo o que favoreceu os experimentos de Franz Mesmer, quando este surpreendeu o mundo, ao proclamar que o corpo humano tinha um fluir e um refluir de energia através do mesmo, que podia emanar através das pontas dos dedos, que era curativa em sua natureza, e que podia ser detectada por outros e influenciar a outros. Suas alegações, naturalmente, eram sensacionais. Elas chegavam aos limites do reino do sobrenatural, quando consideradas pela média das pessoas; Mesmer foi caluniado, como sendo um charlatão e, por causa disto, foi perseguido.
O ocultista procurava investigar a verdade de suas afirmações, não importando quão heterodoxas pudessem ser. O ocultismo, além do mais, proporcionou os experimentos de hipnotismo de Mesmer, numa época em que isto era considerado uma indulgência na prática de magia negra. As demonstrações de sucesso, por um período de tempo, por parte dos ocultistas, em hipnotismo, finalmente compeliram a uma investigação do fenômeno pela ciência física, e a descoberta resultante dos princípios fundamentais da psicologia. A ciência oculta, do mesmo modo, explorou a telepatia mental, a hiperestesia, a comunicação da inteligência sem o uso de meios físicos, e outros aspectos de fenômenos psíquicos, quando estas coisas eram proclamadas como sendo nada menos do que práticas diabólicas, e quando tais tópicos eram absolutamente tabus, em círculos de inteligência e nas universidades. Hoje, há cadeiras de pesquisa psíquica em muitas das principais universidades, com apreciáveis investimentos naquele reino de fenômenos, e diversas universidades conservadoras têm efetivamente editado monografias a respeito de sua experimentação, na telepatia mental.
O ocultismo, entretanto, não é uma ciência, nem uma religião, nem misticismo ou filosofia. Porém, suas revelações têm influenciado, de maneira bastante definida, todos aqueles canais do pensamento humano e suas buscas. As perguntas, naturalmente, se fazem presentes: “Quais foram os primeiros ocultistas? Como vieram eles a existir, como um grupo de pessoas, ou um tipo de pessoas?” O mundo jamais saberá, talvez, os nomes dos primeiros ocultistas. Podemos dizer, geralmente, que eles eram aqueles homens e aquelas mulheres, que conseguiam ver além dos limites da visão objetiva dos olhos, e eram aqueles que conseguiam ouvir além do limite audível de seus ouvidos. Em outras palavras, eram os homens e as mulheres, que não estavam contentes com as limitações de seus sentidos objetivos. Eles não queriam aceitar a mera aparência das coisas.
Os primeiros ocultistas
Talvez a história mais antiga do Egito, uma história escrita por aquele povo, e tomada das traduções dos hieróglifos, em suas próprias fontes secretas, é a história escrita por Manetho. Ele era um homem de grande cultura, de grande poder, e com um acesso ilimitado ao conhecimento arcano e os ensinamentos dos egípcios. Ele era o supremo sacerdote de Heliópolis, da grande Escola de Mistérios, localizada naquela cidade, que era dedicada ao sol, símbolo da força positiva, criativa do universo, de acordo com a concepção, comum, de então. Manetho viveu aproximadamente por volta de 280 AC. Ele é geralmente mais conhecido, porque foi o primeiro a tentar fazer um registro completo, ou procurar descobrir a linhagem dos reis e dinastias egípcios, desde os mais antigos tempos. Mesmo hoje, com o avanço da arqueologia, sua cronologia das dinastias é muitas vezes utilizada, para referências. O que nos importa é que em alguns de suas obras, encontramos que os mais antigos egípcios, dado o próprio interesse deles, devem ter sido ocultistas, e que, portanto, são os mais antigos ocultistas, em termos de tempo, no mundo inteiro.
De acordo com Manetho, os antigos egípcios procuravam descobrir quando apareceu o primeiro mortal sobre a terra. Agora, nós não estamos interessados com o fato que algumas de suas conclusões possam ser infantis e suas assunções, daquela época, possam ser falsas. O fato é que eles queriam ver além do imediato. Eles não estavam contentes em aceitar as coisas, como eles assumiam que pudessem ser; não queriam que o que fosse desconhecido continuasse a sê-lo. De acordo com suas conclusões, o primeiro mortal sobre a terra era alguém conhecido como Hephaestus, um médico grego muito antigo. Estes egípcios, do mesmo modo, afirmavam que ele havia sido o descobridor do fogo, e eles calcularam que seu aparecimento sobre a terra foi aproximadamente 24.000 anos antes da época deles, ou por volta de 30.000 anos de nosso tempo, hoje. Desde estas primeiras investigações ocultas, muita matéria foi acumulada através dos séculos, que mostrava, e ainda mostra, o título de oculta. Alguns dos livros, em que aparece, deveriam ser descartados, pois uma grande parte deste acervo de material já não tem valor; por outro lado, uma parte de tal acervo é realmente merecedora de atenção e mostra uma busca da verdade, e a possível conquista desta verdade.
Deste acervo de material, emergiram sete princípios fundamentais do ocultismo. Estes perduraram, porquanto são práticos e têm um valor moral, como sendo aceitáveis e úteis aos povos de hoje, do mesmo modo como o eram aos povos, no meio dos quais eles foram concebidos. O primeiro destes princípios ocultos pode ser chamado a unidade de todo ser. Em outras palavras, foi uma tentativa para encontrar alguma força ou princípio básico, ou fundamento, pelo qual poderia ser provado que havia uma unidade em toda a existência. Este foi um pensamento ousado, indicando uma extraordinária abertura da mente, num mundo de aparente diversificação. Mesmo hoje, com o conhecimento e acesso a fontes de conhecimento, conforme olhamos em torno e vemos as miriades de realidades, o grande número de diferentes coisas, que compreendem nosso mundo, parece quase impossível conceber que poderia haver qualquer base para uma relação entre estas coisas, extremamente diferentes na aparência e na função. Para os homens, tão distantes de nosso tempo, fazerem uma busca, por uma unidade em tal mundo de variedade, mostra uma séria contemplação.
O Princípio da Unidade
De acordo com o Livro Sagrado, que era o nome de uma das obras de Manetho, preparada por ele para um dos Ptolomeus, e para ser colocada numa biblioteca em Alexandria, os antigos egípcios contemplaram, há longo tempo, esta unidade da existência. Para eles, a deusa Isis era o aspecto materno do universo. Além do mais, de acordo com a obra de Manetho, o nome Isis significava “Eu venho de mim mesma”. Isto indicaria que Isis foi um movimento que se auto-originou; ela, portanto, perpetuou sua própria existência, não teve criador, ela continuou, partindo da natureza de sua própria existência. Foi, além do mais, indicado que aquilo que é, sempre é, em essência. Agora, há, naturalmente, numerosas lendas entre os egípcios, para mostrar que Isis, como uma deusa, veio de alguma outra fonte, porém entre os adeptos das escolas de mistério e entre os verdadeiros ocultistas, Isis, o aspecto maternal, sempre foi, como um atributo fundamental do ser, do qual consiste o universo. Além do mais, nesta obra, a pedra-ímã, o minério magnético, foi chamado ‘ossos de Horus’. Horus era um dos deuses do Egito. De acordo com a teogonia, ele era o filho de Ra – este sendo o sol e o símbolo do poder positivo criativo, emanando através do universo. O minério de ferro era chamado Typhon, um outro deus, simbolizando o poder destrutivo, negativo, do universo, e estes dois poderes atuavam, um sobre o outro, na mesma maneira como o ferro é muitas vezes, tanto atraído ou repelido, pela pedra-ímã. Os egípcios tentaram explicar que, da mesma maneira, o bem, o movimento racional do mundo, muitas vezes atrai Typhon, ou o aspecto negativo, e este movimento bom, racional, persuade e suaviza o poder negativo e mau; assim, de acordo com este antigo escrito, há no mundo um contínuo confronto entre estes dois grandes opostos.
O Livro Sagrado raciocina, mostrando que todo o ser, em seu estado primário, sempre foi. Ele nunca teve um princípio. Nunca houve quaisquer partes dele, como nos parece discernir em nosso mundo. Havia apenas um eterno movimento, a atração e a repulsão entre os dois poderes opostos, assim que um percebe a relação entre a pedra-ímã e o minério de ferro. De acordo com Livro Sagrado, esta oscilação, ou este movimento contínuo, fez surgir os quatro princípios. Estes quatro princípios eram realmente quatro expressões da natureza; em outras palavras, o fogo, o ar, a água e a terra. E as quatro expressões cruzam o mundo inteiro, existem e se movem em toda parte e, assim fazendo, transformam a si próprios; mudam para a infinita variedade das criações e formas, dos quais somos conscientes, como realidades. Naquele antigo tempo, séculos antes dos atomistas gregos, antes de Heráclito e Empédocles, por exemplo, foi declarado, por estes ocultistas, que todas as coisas estão em todo o resto – isto é, que a essência de cada coisa é a mesma, como a essência de qualquer outra coisa, significando que, no seu fundo, todas as coisas são, primariamente, relacionadas. Foi declarado, também, que nada, portanto, no mundo, apesar da sua complexidade ou de sua aparente importância, é independente destas forças primárias da natureza, e nada pode elevar-se acima delas.
Meister Eckhardt, famoso místico e ocultista alemão, muitas vezes chamado como o Pai do Misticismo Alemão, argumentava que Deus está em toda a parte. Deus é o mesmo, em qualquer forma ou aspecto, para aqueles que podem vê-Lo e que O vêem. Ele exorta o ser humano a não procurar Deus, como uma luz reluzente em trevas remotas, ou em algum canto do universo, mas procurar e encontrar Deus em toda e qualquer manifestação da natureza.
O ocultista diz que Deus é um dispersador da mente, através do inteiro universo. Ele chega a esta conclusão, não porque isto satisfaz seu capricho ou sua fantasia, mas porque, após suas investigações, aquela explicação parece confirmar mais rapidamente aquilo de que ele teve a experiência. O ocultista afirma que você somente pode sacar algo da mente de Deus, para utilizar este algo, somente se tiver tido, em primeiro lugar, o conhecimento de suas expressões, sua infinita variedade de manifestações – em outras palavras, suas obras.
Portanto, é preciso que o ser humano estude o self e a natureza, para que possa utilizar plenamente o poder de Deus. O ocultista, além do mais, advoga que não é suficiente apenas satisfazer a nós mesmos, com a crença num Deus, ou conhecer Deus e ter a convicção de que Ele é. Nós temos, também, que usá-Lo, em toda a parte, pois somente no uso de Deus, podemos nos beneficiar de Seu poder e de Sua natureza.
O Mistério do Número
O segundo princípio oculto, honrado através dos tempos, diz respeito ao número. Dentro desta grande unidade do ser, que o ocultista estabeleceu, como seu princípio necessário, tem que haver um plano de operação. Não pode haver apenas um eterno movimento, ou oscilação, de forças através de todo o universo, que seja caprichoso. Este movimento tem que ser de acordo a uma ordem, e tem-se afirmado, neste segundo princípio, que o número é a chave para o entendimento e a direção, pelo ser humano, desta ordem, conforme ele se relaciona consigo mesmo. O número é o comprimento, entre o mundo material e o imaterial. O ocultista compreende, naturalmente, que não há uma separação entre o microcosmo e o macrocosmo; caso contrário, não haveria uma unidade do ser. Num todo, entretanto, o microcosmo é mais discernível pelo ser humano. Seus sentidos objetivos podem perceber mais o microcosmo, e o assim-chamado imaterial, ou intangível, é, para ele, mais difícil compreender, e entender seu relacionamento com ele. Número é o comprimento, é a distância entre os mundos, o material e o imaterial. O ocultista entende, naturalmente, que não há uma separação entre o microcosmo e o macrocosmo; se assim não fosse, não haveria a unidade do ser. Como num todo, entretanto, o microcosmo é mais discernível, pelo ser humano. Seus sentidos objetivos podem perceber mais o microcosmo; e os assim-chamados imaterial e intangível são mais difíceis para sua compreensão, e para que possa dar-se conta de seu relacionamento com eles. O número se torna a chave, pela qual a verdadeira natureza do assim-chamado mundo imaterial nos é revelada, e ele então consegue ver a maneira, na qual este mundo imaterial é contíguo à sua existência material e seu ser.
O princípio oculto do número foi primeiramente expresso na antiga Cabala hebraica. A palavra Cabala, literalmente traduzida, significa ensinamentos tradicionais, secretos. De acordo com a tradição da Cabala, sua origem é por nós identificada como sendo da época de Moisés, quando esteve no Monte Sinai e quando, segundo a lenda e a tradição nos dizem, ele foi testemunha daquela manifestação teofânica. A tradição, além disto, diz que, naquela ocasião, ele recebeu dois tipos de conhecimento canônico – isto é, um conhecimento, que foi transformado em escrita, sobre tabuletas ou placas, coisa que, segundo se diz, ele trouxe com ele, em sua descida da montanha – e também o conhecimento de coisas maravilhosas. Este conhecimento de “coisas maravilhosas”, entretanto, não foi transformado por ele em escrita, pois se diz que ouviu do Senhor, naquela ocasião: “Estas palavras tu divulgarás, e estas palavras tu esconderás.” Foi o segundo item que constituiu o conhecimento das coisas maravilhosas. De acordo com a tradição cabalística, o Cabalista estava proibido de divulgar, ou explicar, o capítulo da criação, perante mais do que um ouvinte, cada vez. Do mesmo modo, não lhe era permitido falar com mais de uma pessoa, por vez, a respeito da carruagem celeste – no caso, referindo-se à natureza de Deus. Estes tópicos eram para serem discutidos, ou falados, somente com sábios, ou seja, com pessoas de profunda compreensão. Consequentemente, a Cosmogonia e a teosofia, o estudo de Deus, foram tratados como estudos esotéricos, isto é, como os ensinamentos internos da Cabala. Poderíamos dizer que, tradicionalmente, a Cabala consistia de uma contemplação do ser de Deus, se Deus havia originado a Si próprio, se Ele havia tido um começo, se Sua natureza poderia um dia acabar; além disto, os ensinamentos consistiam de uma contemplação da origem do universo, e seu relacionamento para com a natureza de Deus. Havia vinte e quatro livros do Canone, a lei da Cabala, publicados – isto é, reduzidos, transformados em escrita, que podiam ser usados pelo profano, por aqueles que eram meramente curiosos, bem como por aqueles que eram estudantes. Havia, entretanto, setenta livros da Cabala, que estavam escondidos, estavam ocultos, eram indisponíveis aos profanos; eram, porém, disponíveis somente àqueles que eram sábios e aqueles que faziam jus a isto, pelo seu próprio merecimento. (Continua)
(Publicado no Rosicrucian Digest, outubro 1946)